sábado, 18 de junho de 2005

Preto no branco

Todos ficámos surpreendidos pelo assalto por "arrastão" na praia de Carcavelos, em Lisboa. Nunca se presenciara semelhante barbaridade em plena luz do dia num país de brandos costumes onde nada parece acontecer.
E de repente o país perdeu a virgindade!
Claro que depois seguiram-se as discussões acesas sobre o sucedido e sobre o que se deveria ou poderia fazer. Na Assembleia da República o debate entre o BE e o PP foi aceso, com troca de galhardetes, fascistas, anarquistas, enfim, algo pouco digno de assistir. Mas, apesar disto, há uma questão fundamental que é necessário analisar com atenção: como explicar este fenómeno e, sobretudo, como preveni-lo/combatê-lo?
Eu e muitos na casa dos trinta e quarenta, ainda nos lembramos de como era relativamente fácil e seguro sair à noite e de dia, sozinhos, para irmos brincar a casa dos nossos amigos. Saíamos das discotecas, já adolescentes, por volta das 6h da manhã ( agora muitos começam a chegar lá a essa hora..) e vínhamos a pé para casa, sem que nada acontecesse.
Fui muitas vezes sozinha para a praia, deixava as coisas na areia para ir tomar banho com os meus amigos e nunca ninguém foi roubado ou importunado.
O que vemos agora é um bando de centenas de pessoas organizadas que assaltam milhares em plena luz do dia numa praia, perante a incredulidade e a passividade de todos. Vemos imagens de gente a ser assaltada em pleno comboio, com o segurança a assistir a tudo e a voltar as costas ao sucedido. E tudo feito nas calmas, com os restantes passageiros a ver e a não se moverem, como se fosse normal e aceitável que alguém maltrate outrém e não se deva reagir.
As pessoas chamam a polícia e ela não aparece. Se aparece para tomar conta de um furto, não tira impressões digitais porque, e essa resposta foi-me dada na cara por um GNR, " isso é só nos filmes"!
Quando a própria polícia confidencia que não pode fazer nada pelos cidadãos porque os juízes soltam toda a gente e há indultos e cunhas em todo o lado, nas câmaras municipais, nos tribunais, então o que nos impede de sermos criminosos? Eu respondo-vos: a consciência. Nada mais.
Relativamente ao assalto na praia de Carcavelos, agora temos vozes díspares: uns defendem que devemos fechar fronteiras porque os pretos só vêm cá para assaltar e matar, outros defendem que não é uma questão de raças mas sim de condições sociais. E as posições extremizam-se.
Aos radicais de direita respondo: a criminalidade não escolhe cor de pele, tanto afecta um preto com um branco. Manifestações como a desta tarde da Frente Nacional, constituída por meia dúzia de cabeças rapadas bêbados, mal escolarizados e broncos é uma resposta estúpida, irreflectida e ignorante, porque não os vi revoltarem-se contra os brancos toxicodependentes que assaltam as pessoas ou os traficantes igualmente brancos responsáveis por esta miséria social. Nem os vi resmungarem contra os políticos brancos corruptos deste país que nos deixaram como estamos, muito antes da entrada maciça de imigração. E tudo isto é criminalidade: feia, suja e má.
Usar os últimos acontecimentos como arma de arremesso racista contra minorias étnicas é infeliz e facilmente rebatida por alguém com dois dedos de testa.
Mas também quero responder aos radicais de esquerda que defendem a desculpabilização dos criminosos, alegando razões de ordem social. Se é verdade que muitos indivíduos não têm acesso a condições dignas de vida, sendo encaixotados em bairros sociais, tal não serve de justificação para tudo. Eu não estou disposta a ir para uma praia e ser assaltada sem ninguém me acudir. Não estou disposta a ter problemas todos os dias na estrada, nos transportes públicos, na rua só porque a justiça não funciona neste país! E não me importa a cor dos criminosos, importa-me e preocupa-me o clima de impunidade e de salve-se quem puder em que este país caiu! Ninguém está a salvo!
Quase dá vontade de perguntar: então e a pena de morte? Não deveria voltar? Para os condenados reincidentes que já demonstraram ser mais prejudiciais do que benéficos para a sociedade? É uma questão de direitos humanos?! Sim, mas e os direitos humanos de quem se vê diariamente em pânico porque tem de apanhar um comboio e não sabe se vai conseguir sair de lá ileso? Ou de alguém que tem medo de dormir porque não sabe se na manhã seguinte ainda tem o seu automóvel intacto na garagem? Ou de alguém que tem a noção de que se lhe acontecer algo na estrada o criminoso fica com pena suspensa e ainda lhe baterá à porta no dia seguinte para uma "conversinha"? Os direitos humanos não são universais?
Esta sensação que os bloquisas transmitem de que o criminoso e o toxicodependente assaltante são doentes que merecem mais a nossa pena do que a nossa justiça já enerva. Até há bem pouco tempo os diabéticos tinham de pagar as suas agulhas para se injectarem com insulina para sobreviverem, mas os toxicodependentes tinham-nas de graça para continuarem a auto-degradarem-se e a aterrorizarem as vítimas, ao encostarem-lhas ao pescoço! Que justiça social é esta??
Que justiça é esta que obriga um polícia a usar balas de borracha para não ferir os assaltantes, enquanto estes últimos atiram para matar? Ou que obriga os polícias a pagarem munições do seu bolso, enquanto o Estado paga milhões de euros ao Benfica para um novo estádio? Ou que fecha esquadras nos bairros para poupar dinheiro enquanto o desbarata nas reformas múltiplas dos nossos políticos? Que merda é esta?
Sinceramente, já não tenho paciência para discursos fascistas ou demagógicos! Não podemos continuar a ver os criminosos pela cor da sua pele ou a desculpabilizá-los porque na infância não tiveram amor de mãe. Temos de agir, temos de defender as nossas vidas, temos de ter um país e não uma instância de férias onde tudo pode acontecer!
Senão, das duas uma: ou tenho de ir ao mapa mundi e escolher outro lugar onde viver, ou compro uma caçadeira.


terça-feira, 14 de junho de 2005

Vai um quilo de condecorações?

No passado dia 10 de Junho que, mais do que um simples feriado, é o dia em que se comemora o dia da nacionalidade, Jorge Sampaio voltou a condecorar personalidades que, supostamente se destacaram em algum domínio, artes, política, entre outros.
Então a lista é recheada de nomes bem conhecidos do grande público: Catarina Furtado, Luís Represas, José Mourinho, Fátima Campos Ferreira, Nicolau Breyner..
Mas o importante aqui é pensar um pouco no valor e no significado de tais condecorações. Isto porque eu parto do princípio de que tal prémio nacional deveria afectar quem de facto se sacrifica pelo país.
Que fizeram estas personalidades?
- Como comparar o valor de Catarina Furtado com o de Paula Ravasco, cientista portuguesa que foi galardoada com o prémio Eminent Scientist of the Year 2004, pela International Research Promotion Council por ter feito um estudo pioneiro no domínio da nutrição nos doentes com cancro? Ou será que estamos a promover apenas caras bonitas?
- Como comparar José Mourinho com António Damásio, um dos mais internacionalmente conhecidos neurologistas em todo o mundo pelo trabalho que tem feito no estudo das emoções e da consciência? Ou estaremos a condecorar arrogância e mau feitio?
- Que dizer de Nicolau Breyner ou de Luís Represas? O seu trabalho é comparável ao dos paramédicos que todos os dias por essas estradas arriscam a própria vida anonimamente? E os bombeiros? Ou é apenas uma forma de mostrar que ser colunável é "super bem"?
Quantas pessoas se arriscam, sem pedirem nada em troca, para salvarem pessoas, para salvarem as florestas, para salvarem animais, para protegerem ecossistemas e não são condecoradas? Vamos condecorar apresentadores, actores, músicos?
Há uns tempos foram os Xutos e Pontapés! Por que não os Ena Pá 2000? Fernando Rocha? Alberto João Jardim? Lili Caneças? Nílton? Pedro Santana Lopes?
Afinal, qual é o critério de merecimento de tal honra?
Sempre achei que uma condecoração significava um reconhecimento por serviços prestados ao país, aos portugueses, à humanidade. Sempre achei que devesse significar que essa pessoa é muito válida para toda uma sociedade, que a vida fica melhor com a sua actuação, que mudou a nossa existência para melhor. Honestamente, não vejo isso nos condecorados deste ano. Além de me encherem os olhos com novelas execráveis, dão-me música desprezível, apresentam-me concursos ou programas acéfalos ou enjoativos e, acima de tudo, trabalharam para si mesmos e para os chorudos salários que auferem. Não lhes reconheço valor a nível nacional.
Se é assim, então fiquem com as condecorações porque é óbvio que elas não devem valer assim tanto. Resta-me a consolação de que pelo menos a consciência é a melhor das medalhas.