terça-feira, 31 de maio de 2005

Desunião Europeia?

Com o recente desaire eleitoral em França, com o "Não" a vencer a constituição europeia, os europeus começaram a questionar até que ponto a união é possível, isto é, se será preferível uma Europa unida em termos económicos, mas não em termos sociais ou legais.
Os portugueses, quando questionados no sentido de um referendo, dividem-se: uns afirmam a possibilidade de votarem "Sim", outros redondamente "Não" e uma silenciosa e prudente franja da população fica-se pelo "vamos ver". Eu encaixo-me aqui.
Até agora, mergulhados num caos económico e social, não nos debruçamos sobre as questões europeias mas suspeito que, mesmo sem toda a panóplia de trapalhadas em que vivemos, a demissão da Europa continuaria a fazer parte do quotidiano luso.
Sou uma europeísta convicta mas não me sinto suficientemente informada para avaliar o impacto que uma constituição europeia teria sobre as vidas de todos, em particular na de cada português. Não conheço as implicações na soberania nem no peso que passaríamos a ter em termos de representação internacional depois da sua adopção. Não conheço, sequer, a orgânica do funcionamento da burocracia e das instituições europeias. E envergonho-me disso. Mas reconheço que falta muita informação ao grande público. Falar-se num referendo a esta constituição sem dotar as pesoas das ferramentas essenciais de reflexão é perder tempo e dinheiro porque estas acabarão por votar em função das cores partidárias e não do que seja realmente melhor para si.
E num país onde o sentimento e a partilha dos valores europeus de tolerância, desenvolvimento e cooperação são tão baixos, faz muita falta uma formação no sentido de uma consciência europeia.
Para aqueles que desejem saber mais sobre a Europa, as suas instituições e o significado da constituição europeia, podem sempre consultar a hiperligação no lado direito sobre o canal europeu "Euronews" e a página seguinte, que contém toda a constituição:
Digitem este endereço e na coluna do lado direito, no topo, em "novidades", encontram "constituição para a Europa" - "apresentação ao cidadão". É só clicar e ler uma versão simples e acessível.
Tudo para que não haja desculpa de não se votar por ignorância. Ainda não li mas fá-lo-ei!
Informem-se, formem uma opinião e divulguem! Só uma população informada defende os seus direitos, cumprindo os seus deveres.

sexta-feira, 27 de maio de 2005

Para reflectir....

No passado dia 24 deste mês, o JN publicou um artigo deveras interessante segundo o qual, entre outras ideias, se faz referência ao facto de apenas no nosso país e na República Checa se defender que mulheres com filhos deveriam estar em casa e não no mercado de trabalho (58% dos inquiridos). Mais: 60% dos portugueses sujeitos a inquérito confessam-se "afastados da Europa", isto é, alheios ou discordantes dos chamados valores europeus. Ainda: enquanto a população europeia que apoia a legalização do aborto ronda os 62%, em Portugal a percentagem não vai além dos 51%, maioritariamente no sul do país. Curiosamente os homens parecem ser mais favoráveis à sua legalização do que as mulheres (56% contra 39%).
Quanto à aceitação da homossexualidade, só somos ultrapassados em preconceito pelos polacos (51% dos portugueses aceitam-na, contra 34% dos polacos).
64% dos europeus acham que a homossexualidade é um modo de vida perfeitamente aceitável.
Mais do que estar a debitar percentagens, até porque o estudo está redigido e é só consultá-lo, urge fazer uma reflexão sobre o PORQUÊ destes resultados.

Por que razões os homens são mais tolerantes quanto à legalização do aborto?
E porque é que no sul essa aceitação aumenta?
A homossexualidade continua a ser tabu neste país?
E, em pleno século XXI, ainda há quem considere que as mulheres foram talhadas para a maternidade e o marido deve trazer o pão para casa?

É fácil constatar o quão fechados estamos sobre nós mesmos em matéria de desenvolvimento. De um lado temos Espanha, do outro o Atlântico, logo não tivemos histórica e culturalmente grandes hipóteses de trocar ideias com outros povos, como a Alemanha, a Suíça ou a Bélgica. Por outro lado, o peso da tradição religiosa neste país sempre condicionou a abertura de horizontes a novas ideias, moldando-nos para determinadas práticas sociais, nem sempre as melhores para o combate à homofobia. Em simbiose com este peso excessivo da religião na vida das pessoas, a ditadura salazarista atrasou ainda mais o desenvolvimento económico, cultural e científico, bem como tantos governos constitucionais pós-revolução, em que os dinheiros públicos foram desbaratados em projectos megalómanos, que em nada contribuiram para a educação e a formação dos portugueses.

Comecemos pela questão da legalização do aborto.
Há uma posível explicação para os homens serem, contra as expectativas, mais favoráveis do que as mulheres. Estas últimas sofrem, desde tenra idade, uma socialização que as empurra para a maternidade: são as bonecas, os carrinhos, os nenucos, toda uma série de artefactos socialmente aceites que inculcam nas meninas o papel da maternidade em inofensivas brincadeiras. Por outro lado, o seu peso no estatuto da mulher é muito grande. Basta folhear as revistas cor de rosa e de fofoquice para verificarmos que mais de metade das pseudo-histórias que por lá pousam são sobre a tia-não-sei-das-quantas que relata como a maternidade mudou a sua vida; depois a modelo que confessa, numa pose natural que anseia por ser mãe; no rei ou príncipe que foi pai e está radiante... enfim, uma espécie de lavagem cerebral que inculca a ideia, nunca de forma inocente, de que casal que se preze tem de ter filhos. Mulher que não os tenha é "seca" (já ouvi várias vezes esta doce expressão).
Assim, há uma pressão social no sentido de se ser mãe e boa mãe, super-mãe.
Por outro lado, no sul pode haver menos resistência à legalização do aborto porque também há menos concentração de influência católica. No norte deste país, a igreja católica tem muito mais poder social, pelo que as mentalidades se inclinam para um maior conservadorismo nesse aspecto.
Claro que quanto à homossexualidade, nem vale a pena falar. Pensemos na quantidade de anedotas, piadas e brincadeiras sobre o tema que circulam e que contamos sem pensarmos duas vezes no conteúdo homofóbico que incluem!
Parece-me que nesse aspecto, e aqui especulo porque nada no estudo a isso faz referência, os homens são bem menos tolerantes. Talvez porque neste campo, sofrem muita pressão para expressarem a sua masculinidade. Emoções não fazem parte do quotidiano de um bom macho português.
Quanto à deliciosa ideia de as mulheres deverem ficar em casa para cuidar dos filhos, devo alertar para vários aspectos.
Primeiro, não há muitos rendimentos familiares que permitam tal luxo. Longe vai o tempo, em que eu e muitos da minha geração, estavam em casa com as mães, enquanto os pais iam trabalhar e chegavam a casa, com a mesa posta, os filhos lavados e o jornal sobre o sofá. Isso acabou porque, felizmente, as mulheres impuseram-se no mercado de trabalho como forças igualmente produtivas.
(Terá acabado mesmo? Mas então porque continuam muitas a ganhar menos por trabalho igualmente desempenhado? Hum..)
Segundo, ninguém pode sentir-se totalmente realizado sem uma profissão, sem uma carreira, onde haja algo mais que mudar fraldas e dar biberões. Há que sair de casa, ter horizontes, conhecer gente nova, ter ambições. E não me parece que possa ser incompatível com a maternidade. A não ser que este desejo masculino de ver as mulheres em casa se prenda com o não quererem partilhar tarefas domésticas. Hum...
Os portugueses continuam a ser demasiado conservadores e não prevejo grande abertura nos próximos tempos. Quando saímos dos grandes centros urbanos e viajamos uma dúzia de quilómetros para o interior, continuamos no Portugal de Rafael Bordalo Pinheiro, atrasado, tacanho e intolerante. E mesmo nos centros urbanos, por detrás dos shopings, dos óculos escuros, dos veículos de alta cilindrada e das roupas da mango e da zara, continuamos a ser uns labregos que pagamos a mais cara internet da Europa, temos a justiça mais lenta, a cultura menos frequentada, péssimos resultados educativos com alunos no secundário que não sabem ler nem escrever, com atitudes intolerantes para com quem é diferente porque aceitar a diferença implica esforço mental para a compreender e o português não sabe fazê-lo. Se geograficamente pertencemos à Europa, socialmente estamos a anos-luz do que por lá se passa, em matéria de educação, saúde, cultura, ciência, mentalidade.

quinta-feira, 19 de maio de 2005

Tou farta!

Hoje, em vez de despejar a minha raiva acerca deste país atrasado sob a forma de opiniões, criticadas por uns, corroboradas por outros, deixo-vos um desafio sob a forma interrogativa, para que meditem sobre o estado da nação:

Por que razão continuamos a ser um país onde tanta gente morre violentamente na estrada?
Por que razão temos tão más estradas se pagamos tantos impostos? Para onde vai todo o nosso dinheiro? Porque é que continuamos a tropeçar em bêbados ao volante nas estradas, de telemóvel na mão? Porque é que nesta porcaria de país continuamos a achar que as bebedeiras são um ritual de passagem para a adultície? Nesse caso, andará por aí muita gente durante tantos anos a fazer a transição?
Porque é que continuamos na cauda da Europa em termos de aproveitamento escolar: serão os professores incompetentes ou os pais e o Estado negligentes? Porque razão se abrem politécnicos e faculdades privadas para onde vão a maioria dos alunos que nenhuma faculdade estatal quer receber, e que depois, à força de propinas e facilitismos, saem cá pra fora sem saberem ler ou escrever e são doutores? E porque hão-de aqueles que até estudam estar no meio desta generalização, apanhando também no pêlo?
Como é possível que tenhamos programas como a "quinta das bestialidades", perdão, celebridades (?) ou as novelas da TVI? Como é possível que a SIC passe uma média de seis novelas por dia? Não andaremos já adormecidos e apalermados o suficiente? Como é que uma .. personagem como José castelo Branco é uma celebridade? E os paramédicos que salvam dezenas ou centenas de vidas por ano? Não mereceriam esses, sim, reconhecimento? Mas quem é que o Sr. Presidente da República condecora? Os...Xutos e Pontapés?
Alguém me sabe explicar porque se respira este clima de impunidade, esta sensação de murro no estômago de que o crime compensa? Para que raio andamos nós a sermos honestos? O que define um culpado em tribunal: as suas acções ou um mau advogado? O que representa realmente o problema de pedofilia da Casa Pia? Gente sem escrúpulos ou políticos e organizações coniventes?
Porque me empurram imagens de iraquianos mortos pelos olhos dentro de cada vez que ligo a televisão? Para me fazer sentir culpada por uma guerra que não comecei e com a qual nunca concordei? Porque é que George Bush existe? Pior, porque é que ganhou outra vez as eleições?
Como é possível que um padre diga na sua homilia que um aborto é pior que o assassínio de uma criança de poucos anos de idade? Quem tem o direito de dizer que um feto tem mais ou menos direitos que uma criança que ama, chora, sente, pensa? Quem vale menos ou mais? Como se qualifica o valor de uma vida?
Porque é que ninguém culpabiliza essas suiniculturas que despejam os detritos nas ribeiras, destruindo-as definitivamente? Porque é que ainda há touradas? Porque é que as pessoas continuam a abandonar os animais na estrada, deixando aos outros a tarefa de os atropelar ou recolher com os olhos lavados em lágrimas?
Será que o ex-ministro do ambiente vai supostamente responder pelas supostas irregularidades supostamente cometidas durante o seu suposto mandato?
Por que razão se permite que os clubes de futebol tenham perdões e adiamentos sucessivos no pagamento dos seus impostos e eu, reles prof, se não os pago passo a ver o sol por detrás das grades? Porque é que os futebolistas ganham o que ganham, por darem pontapés na bola (e não me lixem os puristas do futebol com o-valor-que-os-coitadinhos-têm-e-a-riqueza-que-trazem-ao-clube), enquanto os médicos da AMI trabalham de graça, os bombeiros salvam vidas de graça ou por tusto e meio, ou os professores tentam formar as novas gerações com ordenados que por vezes roçam o valor do ordenado mínimo?
Alguém me sabe explicar como um indivíduo como Alberto João Jardim chegou a político? Pior, como continua onde está há tantos anos? Ou por que razão os deputados se reformam após meia dúzia de anos de trabalho, com reformas escandalosas e eu, se quiser a reforma, tenho de trabalhar mais de 30 anos?
Alguém me sabe explicar como é que um reformado pode viver com uma reforma de 150 euros? O seu trabalho valeu menos do que o do Cristiano Ronaldo? E porque é que temos de trabalhar tantas horas por dia, não tendo tempo para ver os nossos conjuges, os nossos filhos, os nossos amigos, nós mesmos ao espelho? PORQUE É QUE NÃO TEMOS TEMPO PARA PENSAR?

PORQUÊ????????????????????????????????????????????????????

Honestamente eu tenho a resposta mas acho que cada um tem de procurar compreender o que está mal neste país. Por isso serei egoísta em não a dar e, simultaneamente, altruísta por vos obrigar a nela pensar. Entre o peixe pescado e o ensino do uso da cana de pesca, vou pela segunda via.

sexta-feira, 13 de maio de 2005

A barbárie circense


Junto à escola onde trabalho instalou-se um circo, como muitos outros que por esse país circulam. Este não foge à regra da grande maioria dos circos: arrasta consigo vários animais selvagens ou que, pelo menos, o deveriam ser: camelos, hipopótamos, lamas, tigres...
E instalou-se junto a uma escola, precisamente porque são as crianças as principais clientes e as maiores vítimas do mau serviço educativo prestado por estas organizações itinerantes.
Quem se der ao trabalho de observar em vez de se limitar a ver e deslumbrar pelo aparato, verifica que os animais em causa, em especial os grandes felinos, apresentam comportamentos impróprios para a sua espécie, já para não falar de, em alguns casos, maus tratos físicos e sobretudo psicológicos. Muitos deambulam pelas jaulas minúsculas de um lado para o outro, roendo as barras, demonstrando stresse e comportamentos estereotipados de clausura. Um tigre necessita de um território de vários quilómetros quadrados, já para não falar do facto de ser uma espécie ameaçada, devendo por isso ser protegido por todos os meios.
Quando as pessoas compram um bilhete para assistir a um circo com animais estão a ser cúmplices de maus tratos e de desrespeito ao meio ambiente. Ver um elefante a erguer-se nas patas traseiras tem por detrás uma rotina baseada em choques eléctricos e correntes, aguilhões e interferência no ritmo de vida normal de um animal que não foi concebido para viver agrilhoado ou para ser exibido em matinés.
Se queremos de facto entreter os nossos filhos levemo-los a um parque, brinquemos com eles, ensinemo-lhes o valor da preservação da natureza, do respeito por todas as criaturas vivas, acampemos com eles. Ou então visitemos circos sem animais, onde a verdadeira arte circense do engenho e habilidade humana se façam notar. Rejeitar circos com animais é demonstrar que o entretenimento não tem de andar a par da crueldade e incentivar outras formas de arte. O "Cirque Du Soleil" é mundialmente conhecido por não recorrer a animais, baseando-se nas acrobacias humanas e na arte de entreter, tendo sido reconhecido como um dos melhores do seu género.
Neste momento, em muitos países desenvolvidos, dos quais não fazemos parte, infelizmente, já chegaram à conclusão de que os circos com animais são desnecessários, para além de deseducativos, tendo inclusivamente proibido a sua existência.
Para saberem mais pormenores sobre a crueldade dos circos com animais, consultem as páginas:

segunda-feira, 9 de maio de 2005

Diz-me o que exiges, dir-te-ei quem és!

No Jornal de Notícias de hoje vem uma reportagem sobre as condições de higiene do mercado de Espinho e é curioso analisar a postura do português comum perante aquilo que já todos deveríamos considerar como um dado adquirido no mundo civilizado: a higiene.
Quem já efectuou compras num mercado ao ar livre, já deve ter reparado que muitos dos alimentos frescos se encontram a descoberto, sobre bancadas em caminhos de terra, à mercê dos elementos. Salvo algumas excepções de comerciantes mais rigorosos, a maioria não tem qualquer cuidado com o manuseamento dos víveres.
Nessa reportagem levanta-se a questão aos feirantes sobre os cuidados a ter na preservação dos alimentos, por uma simples questão de higiene. Estes retorquem que sempre assim foi e o mais importante é não espantar o cliente. Além disso, nunca morreu ninguém por esta falta de cuidados, logo porquê mudar?
Mas se este ponto de vista ignorante até se compreende por parte de quem quer vender, não se compreende por parte de quem quer comprar e deve sempre exigir o melhor. Um consumidor abeirou-se da equipa de reportagem e disse esta pérola: "O que não mata, engorda!".
Permiram-me discordar: às vezes o que não mata, emagrece ou enfraquece. Uma constipação, uma doença venérea, uma perna partida, uma brucelose podem não matar mas certamente não engordam e muito menos fortalecem. A falta de higiene muito menos.
Nestes mercados, há de facto alimentos expostos a todo o tipo de elementos: pó, secrecções salivares e outras de que prefiro não me lembrar, sendo manipulados com frequência com as mesmas mãos descobertas que acabaram de fazer o troco ao cliente anterior. O pão e doçaria são exemplos flagrantes disso. Os cremes à base de ovos à temperatura ambiente são terreno propício para o desenvolvimento de salmonelas, responsáveis por muitos distúrbios digestivos. Mas o português pouco habituado a ser cuidadoso com os seus direitos e a sua saúde é pouco exigente e tudo lhe serve.
Quando uma praia é interdita ao público porque foram detectados coliformes ou outros microorganismos perigosos para a saúde, é ver o povo revoltado porque lhe estão a tirar aquilo a que tem direito: uma boa intoxicação ou doença cutânea.
"Eu sempre vim a esta praia e nunca vi nada!" ou então "Vim aqui assim ver e não vi nada, a praia está limpa como sempre!", são afirmações ignorantes e perigosas, em especial quando arrastam crianças incapazes de se defender quer dos microorganismos, quer dos incapazes dos progenitores. Qual deles o mais perigoso....
A saúde pública é um item que pouco preocupa os portugueses. É só ver a quantidade deles que não lavam as mãos após uma ida à casa de banho...pública. E depois são as mesmas a quem vamos apertar a mão num acto social..
Muitos problemas sanitários estariam resolvidos se as pessoas se habituassem a lavar as mãos depois das idas aos lavabos ou antes de comerem algo. Mas tal não acontece.
A postura tipicamente lusa de que "o que não mata engorda" não só é perigosa como traduz a tipica postura que nos caracteriza em muitas das coisas que fazemos: o deixa andar.
Exigir mais higiene é exigir mais saúde. Exigir mais saúde é o que define a qualidade de vida. E isto tem de passar por todos. Se não para nós, pelo menos para os nossos filhos, que herdarão os nossos hábitos e as nossas vicissitudes, se não tivermos uma visão de futuro.

sexta-feira, 6 de maio de 2005

Vergonha na Holanda

Aquando do jogo de ontem do Sporting, vários "jornalistas" comentavam, indignados, a falta de qualidade do estádio da equipa holandesa, como um ultraje. Como se admite que a Holanda possa ter um estádio tão mau? Realmente, ainda se fosse um hospital, uma escola, o sistema rodoviário, o sistema nacional de saúde... enfim, agora um estádio? Inadmissível!
Proponho aqui uma moção de censura ao governo holandês que se preocupa em ter bons hospitais, uma economia forte, um sistema educativo funcional, uma imagem turistica impecável, o moral dos seus cidadãos em alta mas.. se atreve a não ter bons estádios de futebol.
Sim, porque que seria de nós sem um bom estádio de futebol? Proponho também que a partir do próximo ano, em cada freguesia se construa um estádio de futebol e um shopping ao lado. Deitem-se abaixo os postos de saúde, os hospitais, as casas do povo, os centros comunitários, as piscinas municipais (quem quiser tomar banho que o faça em casa), os mercados, os jardins públicos (só servem para os cãezinhos fazerem as suas necessidades e os drogados, coitados, assaltarem os velhinhos), as galerias de arte, os museus, para nas ruínas se fazerem belos estádios aos quais poderemos recorrer para sermos tratados dos nossos cancros, convivermos com as crianças, comprarmos os bens de que necessitamos diariamente, aprendermos mais sobre a história do nosso país, enfim, descobrirmos o verdadeiro sentido da vida.
Passemos a usar as verbas dedicadas à cultura, à educação e à ciência que, juntas, não pagam os ordenados dos jogadores profissionais de futebol, para constituirmos um fundo de reserva para novos estádios quando conseguirmos convencer essas bestas que se preocupam com outras coisas que não a bola a deixarem os clubes de futebol e as suas dívidas em paz.
Para terminar, proponho que os nossos impostos que afinal não servem para nada e não, passem a constituir o fundo de reforma para os dirigentes futebolísticos, bem como os da Liga, pessoas honestas, honradas e dignas, porque ninguém como elas trabalha para o bem da nação, zelando para que Portugal seja conhecido como o país onde os jogadores, afáveis e educados, agridem árbitros e treinadores, pagam os seus impostos e primam quer pela linguagem, quer pela profundidade de pensamento.

terça-feira, 3 de maio de 2005

A Justiça dos Homens

Ainda há poucos dias num jornal de grande tiragem surgia a notícia espantosa: num estado norte-americano uma criança de 13 anos será forçada a levar uma gravidez até o seu termo, "no interesse da jovem". Tudo em nome da moral e dos bons costumes norte-americanos.
No interesse da jovem?!
Estamos a falar de uma criança de 13 anos cujos passatempos devem estar no domínio da Barbie, do Cartoon Network e dos rebuçados. Estamos a falar de uma criança que mal deve saber como tudo aconteceu, que ainda deve dormir ao lado da boneca preferida. Tudo no interesse da própria jovem...
Deixem-me que vos diga uma coisa: nunca as crianças e os adolescentes estiveram tão rodeados de sexo e nunca souberam tão pouco acerca dele.
A sexualidade desenfreada invade as suas cabeças: nas músicas, na MTV, nas revistas, na publicidade, nas roupas, nas atitudes. Em Inglaterra há linhas de lingerie dos 9 aos 13 anos! Dos 9 aos 13 anos! Wonderbras, tangas, ligas, tudo para crianças! O problema é que as crianças e os adolescentes não têm tempo ou capacidade para digerirem tanta sexualidade quando ainda tresandam ao leite que as mães lhes deram!
Na notícia não se especificava o porquê de tal gravidez: por relações consentidas ou por violação. Mas que diferença há?? Se foram relações sexuais consentidas, onde estavam os pais para lhe terem explicado que 13 anos é demasiado cedo para sexo? Onde estava a escola com a tão desejada "educação sexual"? Onde estava a sociedade para impor limites ao que deve ser transmitido aos mais jovens? O que leva estes miúdos a terem sexo como quem ouve música? A culpa é de todos nós que lhes enfiamos sexo pelos olhos dentro e depois esperamos que se contentem em saltar à corda ou a trocar cromos. Seja como for, esta criança é uma vítima!
Se as relações sexuais não foram consentidas, então ela é duplamente vítima: de uma violação física e de uma violação social porque nunca ela estará preparada psicológicamente para ser mãe. Ser mãe é um processo que implica maturidade fíísica, maturidade emocional e poder de decisão económico. E esta criança não tem nenhum deles!
Aonde irá buscar o cálcio para a formação do feto? Aos seus ossos, que dele precisam para o seu próprio crescimento. E as proteínas? Aos seus músculos em desenvolvimento. Duas crianças a competirem pelos mesmos nutrientes.
E a sua adolescência? Aonde a irá buscar?....A lado nenhum pois as responsabilidades da maternidade roubar-lhe-ão o resto de meninice.
Defender a vida? Com certeza, mas não a todo custo, não pelo preço de outras vidas que ficam destroçadas. Não em nome de um puritanismo ridículo, de valores que não dão resposta às necessidades reais das vidas das pessoas. Os valores devem existir para orientarem a conduta humana, não destruí-la!
Obrigar esta criança a ter outra criança é violá-la no seu direito fundamental: o de ser ela própria.
Os coelhos têm crias porque o seu instinto lho "diz" para o fazerem e fazem-no porque não têm alternativa. Criam vida pela vida. Mas o ser humano não é um coelho, cria vida quando tem condições para tal, não porque tem de ser.
A hipocrisia social não tem limites. os movimentos pró-vida (como se os outros fossem pró-morte..) incitam, pelo terror, as pessoas a procriarem contra a sua vontade, a qualquer custo e quando as crianças indesejadas nascem, onde estão os pró-vida? Estão lá para apoiarem essas famílias? Não, são os mesmos que depois as evitam.
Definitivamente, a maternidade tem de ser uma questão de escolha e não uma imposição de fora, como se a vida fosse mais importante que a qualidade de vida.